domingo, 31 de janeiro de 2010

Saudade

Não sei ao certo como começar esta carta mas sinto que é necessário escrever-te.

Ainda não aceito a tua fuga á vida mas até consigo compreender.
Muitas vezes disseste-me: "Quem me dera já não estar aqui. Apetece-me morrer." Também tu, ao longo dos teus 75 anos, foste perdendo as pessoas que amavas e que querias ter por perto e, no fim, já nada te prendia aqui, a este mundo onde deste tanto de ti e do teu trabalho. Compreendo essa evasão porque sinto agora a tua dor e todos os dias penso: se alguém pudesse tocar na dor que tenho cá dentro saberia aquilo que estou a sofrer calado e saberia do meu desejo de estar noutro lugar. Bem perto de ti.

Meu Deus, como eu te amo. Juro por tudo que, se eu pudesse trocar o meu lugar contigo não hesitaria um segundo.

Tu foste a única pessoa que sabia que eu te amava incondicionalmente. Muito para além das barreiras da doença e da tristeza. Foste a única pessoa a qual eu podia dizer gosto de ti, amo-te... Não sou muito de falar estas palavras (escrevo-as melhor) mas a tua doença, e o medo que tinha que te esquecesses, fazia com que eu te lembrasse, todas as poucas vezes que ultimamente estava contigo, que o meu sentimento era recíproco .

Estive a morar contigo meses antes da tua partida mas por pouco tempo porque não consegui aguentar aquilo em que tu te tornaste. Eu não podia conceber que aquela mulher que me criou, que esteve sempre comigo nos momentos mais importantes da minha vida, eras tu. Eu agora para ti era um estranho. E a verdade, é que para mim, também eras uma estranha. Tentei debater-me comigo, a tentar agarrar-me á ideia de que poderia não ter outra oportunidade de estar tanto tempo contigo, mas não fui capaz. Depois disso, deixei de te ir ver tantas vezes quanto desejava embora toda a gente dissesse o contrário , que tinha que ir ter contigo, estar mais contigo... mas não. Não era para mim. Não podia.
E passo a explicar-te porquê.

Eu tenho o dom de conseguir destruir tudo aquilo que eu amo.
Á minha volta tenho um mundo e não me apetece vivê-lo. Muito menos agora. Eu destruo as minhas convicções e corrompo as convicções que os outros depositam em mim e até neles próprios. Eu escrevo isto com a plena consciência de que eu já me aceitei como sou. Só ainda não sei se tudo isto me torna uma má pessoa mas creio que sim. Eu destruo a capacidade que tenho para amar assim... num ápice. E contigo não foi excepção.

Sim, deveria ter estado contigo sempre.

Sim, deveria morrer contigo a teu lado porque a saudade é difícil de suportar.

Mais uma vez não sou capaz. Todas as noites adormeço e acordo de repente a pensar em ti e na minha cabeça recordo a tua imagem. Vivo o dia a dia a pensar que te posso ir ver e á noite enfrento a dura realidade de que já não te vou ver mais. Isto não é uma vida que se queira levar. Tenho muitas saudades tuas e não as quero para nada.

Do fundo do meu coração espero que não demore muito tempo a chegar o caminho que me levará até ti.

Até lá estarás comigo.
Amo-te.

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